AS FACES DA FOME

George Vandeman

Eles viajam ao redor do mundo para se encontrar com a tragédia. Eles investem a vida nos habitantes do nosso planeta mesmo sabendo que terão um mínimo de chance de serem bem-sucedidos. Eles assumem posições heróicas nos vilarejos mais distantes da terra. Quem são essas pessoas que travam essa luta incansável contra a fome e as doenças? O que os torna fortes? E acima de tudo, numa época em que trinta e cinco mil seres humanos morrem diariamente de causas relacionadas com a fome, o que os faz pensar que é possível vencer esta guerra?

A fome é um problema estarrecedor. Todos os anos 13 a 18 milhões de pessoas morrem de fome. Para muitos de nós que raramente perdemos uma refeição, é muito difícil entender que mais pessoas morreram de fome durante os últimos dois anos do que na primeira e na segunda guerra mundial juntas. As estatísticas geralmente nos deixam indiferentes. Mas por trás de cada número há uma face, a face de uma mãe, de um bebê, de um avô, de um adolescente. Das 24 pessoas que morrem a cada minuto de causas relacionadas com a fome, 18 são crianças. Sim, o problema pode parecer grande demais. Como é que podemos ajudar os milhões de crianças nascidas na pobreza, carecendo dos cuidados mais básicos? Existem muitas crianças carentes; as necessidades são enormes. O que uma pessoa apenas pode fazer?

Bem, Olive Fulfer decidiu fazer alguma coisa, ajudar um bebê de cada vez. Ele afirma: “Estamos convidados a mãe para trazer o bebê ao centro de recuperação e o manteremos aqui várias semanas. Se este bebê não receber ajuda, não viverá muito tempo.”

Algumas pessoas perguntam: “Como manter alimentadas todas essas pessoas desesperadas? Certamente não existe alimento suficiente para isso.” As necessidades dessas pessoas são enormes. Não há alimento suficiente em sua terra desprovida. O problema se espalha por vastos continentes. O que uma pessoa pode fazer? Bem, Jim Rankin decidiu tentar ajudar uma lavoura de cada vez. Ele diz: “Muitos dos camponeses obtêm menos de 80% do mínimo necessário para a saúde e nutrição. Os camponeses escolhem um ou dois homens, mulheres, rapazes ou garotas e os mandam para treinamento. Nós os recolhemos, damos-lhes casa e comida e os treinamos na produção de alimentos, na saúde básica elementar, na nutrição e em primeiros socorros. Eles ficam conosco durante 16 semanas e então os mandamos de volta para a vila.

Quando ouvimos sobre as milhares de vilas isoladas em regiões distantes, cercadas pela pobreza crônica, os problemas novamente parecem insolúveis. O que uma pessoa pode fazer por essas outras pessoas trancadas nesse ciclo de pobreza, sujeira, doença e ignorância?

Cynthia Di Pinto decidiu que podia fazer alguma coisa: uma vila de cada vez. Ela afirma: “Quando o projeto começou nesta vila, havia muitos porcos correndo soltos. Havia poucos esgotos e muitas poças de lama. Isso tudo trazia doenças para a vila. As crianças estavam sempre doentes; havia muitos casos de diarréia. Assim que o projeto chegou e tivemos uma “treinadora para a vila”, ela começou a ensinar nutrição e a ensinar as mães a cuidarem melhor de suas crianças. Assim, a saúde delas melhorou de fato. Elas prenderam os porcos, limparam todo o local, e também plantaram hortas. Portanto sua nutrição está bem melhor. E o melhor de tudo é que desenvolveu-se neles um verdadeiro orgulho.

Um simples necessidades como a água, pode ser um tremendo problema em muitas regiões do mundo. A falta de boas fontes resulta em péssimas colheitas, péssima higiene. Nos países do terceiro mundo, as epidemias podem ser localizadas em alguma fonte infectada onde um a vila inteira se utiliza dela para beber e banhar-se. O que uma pessoa pode fazer?

Gilbert Tan concluiu que poderia ajudar com um poço de cada vez. Ele diz: “O poço de água é vida para eles. Eles tinham dificuldade em obter essa água. Costumavam tirar água do esgoto da rua principal ou então do rio, que algumas vezes é salgado. Agora, com o poço, podem usar a água para beber, lavar e cozinhar.”

Prover tratamento médico nessas comunidades isoladas na selva ou em povoados nas montanhas é uma tarefa gigantesca. Há incontáveis pessoas precisando desesperadamente de tratamento dentário, remédios, primeiros socorros, cirurgias. Uma vez que o hospital mais próximo há centenas ou até milhares de quilômetros distantes, o que pode ser feito?

O doutor Chester Kamu achou que podia fazer alguma coisa: atender um paciente de cada vez. Veja o que ele diz: “O que aconteceria se as pessoas simplesmente morressem? Não existe outro meio de obterem tratamento médico ou orientação. Tratamos destas pessoas, das doenças que elas têm, e ao mesmo tempo lhes falamos sobre o Médico dos médicos. Acho esta a parte a mais gratificante em meu trabalho como médico-piloto.”

Todas essas pessoas que decidiram fazer alguma coisa, fazer parte do Trabalho da ADRA, Agência Adventista de Desenvolvimento e Recursos Assistenciais. Orgulho-me por esse ministério da minha igreja, a Igreja Adventista Do Sétimo Dia. A ADRA está trabalhando em 70 países ao redor do mundo, demonstrando o quanto pode ser feito.

Temos conosco o Pr. Ralph Watt, presidente da ADRA. Seja bem-vindo e obrigado pela presença.

Watt: É um prazer estar com você.

Vandeman: Obrigado. Fale-nos um pouco sobre seu trabalho, sua fantástica missão.

Watt: Nosso alvo como agência é proporcionar uma vida melhor para os necessitados. Como agência cristã, cremos que o exemplo de Cristo deve ser seguido. E, assim como Jesus andou fazendo o bem, também é nossa responsabilidade levar a graça de Deus para a vida de milhões que vivem na pobreza e necessidade.

Vandeman: Nós sabemos como Jesus fez isso. Como vocês estão fazendo?

Watt: Existem muitas maneiras pelas quais podemos ajudar. Atendemos o mais rapidamente possível. Por exemplo, nas épocas de catástrofes, levamos alimentos, roupas, abrigo, assistência médica às vítimas, como na Armênia. Ficamos nas comunidades e auxiliamos um programa de reabilitação fixando as pessoas em lares permanentes e empregos estáveis. Ajudamos as comunidades, construímos escolas, clínicas e estradas. Tentamos ensinar às pessoas as coisas simples que precisam saber para tornar melhor sua vida.

Vandeman: Acho que nossos amigos gostariam de saber como vocês estão cuidando da fome e das doenças.

Watt: A ADRA faz parte de um esforço de âmbito mundial para diminuir a mortalidade infantil e melhorar a saúde das mães e dos bebês. Creio que esta é uma das mais importantes iniciativas em que estamos envolvidos. Com este programa a amamentação e higiene e fornecendo alimento suplementar para eles.

Vandeman: De modo permanente, o Senhor diria que a educação é uma coisa importante?

Watt: O segredo é desenvolvimento. O aspecto do desenvolvimento é a auto-suficiência. Sem dúvida acreditamos que este é um dos pontos-chave para uma vida melhor, e para muitas pessoas no campo, isto significa melhor suprimento alimentício. Nossas iniciativas na agricultura visam ao aumento da produção de alimentos. Isso pode exigir a construção da estufas nas planícies altas dos Andes para aumentar as safras naquele clima. Ou talvez construir incubadeiras de peixe no Sarawak para aumentar a produção de alimentos. Na Tailândia, por exemplo, os lavradores podem tomar emprestando sementes de arroz da ADRA assim como você e eu tomamos dinheiro emprestado de um banco. Nós também temos programas destinados a emprestar a eles animais para os arados, se necessário. As iniciativas na agricultura são algumas das coisas emocionantes que podemos fazer.

Vandeman: Tremendamente prático e eficiente. Deus o abençoe e a obra que vem realizando. Obrigado, Ralph.

As pessoas estão fazendo a diferença. Mas há outro problema que muitos de nós não queremos enfrentar. Muitos acham difícil se envolver, é bem mais fácil ficar apático. Existem coisas que estão entre nós e existem as necessidades do mundo. Primeiro, há o problema do isolamento. Todas essas pessoas famintas parecem estar muito distantes.

Ficamos observando de uma grande distância as pessoas esperando sob o sol abrasador em algum deserto escaldante a chegada dos sacos de cereais. Jamais passamos por situação semelhante. O povo em desespero talvez fale um outro idioma e tenha uma cultura diferente, talvez até creia em um Deus diferente. É fácil ficar emocionalmente isolado de todas essas pessoas necessitadas lá longe, enquanto estamos a salvo em nosso conforto. De fato, nós não os identificamos como próximos, como nossos próximos. Mas as Escrituras têm algo bastante claro para dizer sobre esse tipo de isolamento. Provérbios 22:2 diz: “O rico e o pobre se encontraram: a todos os fez o Senhor.”

Sim, partilhamos de um elo comum com o povo que pode parecer totalmente estanho em sua pobreza. e este é um elo muito importante: a irmandade dos filhos de Deus.

O mesmo Senhor que nos fez, os fez também. O mesmo Senhor que Se preocupa conosco Se preocupa com eles. Eles também são filhos de Deus. Sim, quando olhamos de perto, podemos ver em seus rostos esse elo comum. Seres humanos que riem, choram e têm esperanças, assim como nós. têm olhos que brilham de alegria, olhos que esmaecem com o desespero, assim como nós. Estes também são filhos de Deus. E Ele nos pede para sairmos de nosso isolamento e mostrarmos o Seu amor a todos aqueles que Ele chamou de nosso próximo.

a segunda coisa que fica entre nós e as necessidades do mundo é precisamente o que mais deveria capacita-nos a ajudar: abundância material. Nós no ocidente temos muito; nosso shoppings estão repletos de mercadorias. Temos fartura. Muitos de nós não têm necessidade de mais bens. Mas tragicamente, nossa bênçãos podem nos afastar daqueles que não são tão abastados. O materialismo tende a diminuir nossa sensibilidade às necessidades dos outros. Repetidas vezes têm sido demonstrado, infelizmente, que quanto mais as pessoas possuem, menos inclinadas estão a dar. Descobrimos que os mais generosos entre nós são muitas vezes os que estão mais próximos da pobreza.

Bem, acredite, Deus observa quando o rico fica mais rico e o pobre mais pobre. Seus profetas protestavam sistematicamente contra aqueles que cruzavam os braços deixando o necessitado sofre. Eles clamavam contra aqueles que, por ganância, se tornavam a causa da pobreza. O profeta Amós, uma vez ameaçou que Deus mandaria fogo sobre Judá e consumiria Jerusalém. E Amós nos revela parte do motivo: “… porque vendem o justo por dinheiro, e o necessitado por um par de sapatos. Suspirando pelo pó da terra sobre a cabeça dos pobres, eles pervertem o caminho dos mansos…” Amós 2:6 e 7.

Naqueles dias, um devedor podia ser vendido como escravo se não conseguisse saldar a sua dádiva. E Amós diz que seres humanos estavam sendo vendidos apenas por deverem um par de sapatos. Eles estavam pisando na cabeça dos pobres. É chocante pensar que vidas eram destruídas por causa de algumas moedas.

Mas pense no que está acontecendo hoje. Sim, com pouco dinheiro se pode comprar alimento no terceiro mundo suficiente para sustentar uma família inteira por uma semana. Mas e se vemos essas necessidades e nada fazemos? E se deixarmos pessoas morrerem pelo valor de um par de sapatos? O Novo Testamento reflete esta preocupação apaixonada pelo pobre. Paulo, por exemplo, foi muito claro sobre como devemos usar nossos recursos materiais. Recentemente alguns cristãos têm usado algumas passagens bíblicas como desculpa para simplesmente acumular mais riquezas. As bênçãos materiais passam a ser vistas como um fim em si mesmas. Mas esse não era o ponto de vista de Paulo. Veja esta promessa que o apóstolo fez aos cristãos em Corinto: “Para que em tudo enriqueçais para toda a beneficência, a qual faz que por nós se dêem graças a Deus.” II Coríntios 9:11

Aqui Paulo afirma que Deus é capaz de fazer de nós “ricos em todo sentido”. Assim, se ficarmos ricos com bênçãos materiais, o que devemos fazer? Qual é o propósito desse tipo de riqueza? Paulo responde de modo claro; ser generoso em todas as ocasiões. Nossa generosidade resultará em grande ação de graças a Deus quando damos àqueles genuinamente necessitados. Eles agradecerão a Deus pelas bênçãos que os resgataram da fome, doença ou desespero. A Bíblia declara que dar ao pobre é um dos melhores investimentos que podemos fazer. Provérbios 19:17 diz: “O que se compadece do pobre empresta ao Senhor, que lhe retribuirá o seu benefício.”

Quem dá aos pobres empresta a Deus. Não há melhor lugar para nossas bênçãos espirituais; não há modo melhor para romper a indiferença do materialismo.

Há uma última barreira entre nós e as necessidades do mundo no especialmente para os cristãos: é a tendência de ver nossa missão no mundo como puramente espiritual. Acreditamos que proclamar as boas-novas é nosso alvo principal. E é verdade. Mas às vezes vemos o atendimento às necessidades físicas como algo menos espiritual, algo um pouco abaixo de nossa verdadeira tarefa no mundo. Mas, é claro, Jesus não dividiu Seu ministério em “realmente” espiritual e “menos” espiritual. Pregar, curar e confortar faziam parte de um todo. O ministério de Jesus atendia a todas as necessidades do homem, todas elas. Ele proclamou o Reino, explicou seus princípios espirituais, curou os cegos, aleijado, os aflitos sem esperança; Ele expulsou demônios, recebeu os banidos socialmente, alimentou audiências famintas junto ao mar da Galiléia, e sempre demonstrou uma preocupação especial pelo pobre. Todos os que lêem as Escrituras vão se lembrar disso. Cristo nos pede para fazer uma obra similar no mundo – atender todas as necessidades do homem, tanto físicas quanto espirituais. Em sua segunda carta aos Coríntios, Paulo fala sobre exceder em diversas graças: exceder na fé, no testemunho, no amor; todas qualidades que devemos ver como “espirituais”. Mas aí ele acrescenta: “… assim também abundeis nesta graça”. II Coríntios 8:7.

Dar. Essa é a graça cristã. Isto é algo em que os cristãos também devem exceder, tanto quanto exceder na fé e no testemunho. Nesta capítulo, Paulo chama a atenção dos coríntios para Cristo, o qual sendo rico no Céu, tornou-Se pobre para o nosso bem, para que pudéssemos nos tornar ricos espiritualmente através da Sua pobreza.

Que exemplo de doação! O Salvador do mundo Se tornou pobre para que pudéssemos nos tornar ricos. O que fazemos com nossa bênçãos materiais tem muita importância. O que fazemos com relação ao pobre e necessitado é um componente chave da nossa fé. Jesus demonstrou quão importante isto é realmente na parábola concernente ao juízo final. Ele apresenta o mundo dividido perante Deus, o Rei. Alguns à Sua direita e alguns à esquerda, os salvos e os perdidos como as ovelhas e os bodes. Veja o que Ele diz àqueles dois grupos, e como Ele os divide: “Então dirá o rei aos que estiverem à sua direita: vinde, benditos de meu pai! Entrai na posse do reino que vos está preparado desde a fundação do mundo. Porque tive fome e me destes de comer; tive sede e mie destes de beber; era forasteiro e me hospedastes; estava nu e me vestistes…” Mateus 25:34-36.

Bem, ao ouvir tal elogio, o justo pergunta perplexo: “quando estivestes com fome ou sede ou fostes forasteiro?” E eis a resposta, versículo 40: “…em verdade vos digo que, quando o fizestes a um destes meus pequeninos irmãos, a mim o fizestes.” O que fazemos com os pobres importa sim. O justo é caracterizado pelo que ele faz por “meus pequeninos irmãos”. E o próprio Cristo Se identifica com os necessitados. Você quer servi-Lo”? Ele diz: “estou ali nos rostos tristes do faminto. Estou ali entre as mães com seus filhos mal nutridos no colo. Estou ali entre aqueles presos no círculo vicioso da doença e da pobreza. Você quer Me servir? Sirva-os.”

Watt: Queremos agradecer a Deus pela inspiração do serviço que possibilita alimentar mais de um milhão de pessoas por dia nestes últimos anos. Deus, que fez brotar água da pedra, nos capacita a levar vida às planícies áridas. Jesus, que chama as criancinhas para Si, também nos chamou para o ministério do serviço.

Vandeman: Agradeço a Deus por Ministérios como a ADRA que está cumprindo o mandamento de Cristo para O servirmos cuidando dos necessitados. A fome mundial é um problema muito grande. Às vezes parece que podemos fazer bem pouco. Mas muito têm sido feito. Muitas pessoas têm sido salvas da doença e da inanição. E melhor de tudo, muitas estão sendo treinadas para a auto-suficiência e fuga do ciclo de pobreza. Oro para que cada um de nós encontre um modo de se tornar envolvido. Podemos todos ajudar, pessoalmente ou através de contribuições. Um bebê de cada vez, um poço de água de cada vez, uma fazenda de cada vez, uma vila de cada vez. Podemos fazer a diferença.

Por favor, não fique isolado; por favor, não pense nos necessitados como um problema distante em outro mundo. Jesus Cristo fez de todos eles o nosso próximo. E Ele nos pede para O vermos em cada um desses nossos pequenos irmãos.